quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Sobre uma história que eu não achei um porquê

Ela teve um dia normal.
Acordou lá pelas 9 horas, comeu, tomou banho, lavou a louça, se arrumou, almoçou e saiu.
Pegou seu ônibus habitual, viu as mesmas pessoas, a mesma paisagem.
Desceu do ônibus em direção à escola.
Entrou na sala, viu as mesmas pessoas.
Seu corpo estava presente, mas seus pensamentos eram tão longínquos quanto a distância dela e de seus desejos.
Saiu da escola, comeu qualquer coisa, voltou pra casa fazendo o mesmo caminho da vinda.
Desceu do ônibus, com uma preguiça imensa de andar as duas quadras que separavam o terminal de sua casa.
Foi andando vagarosamente, como se não tivesse mais nada pra fazer.
Era uma noite agradável, com uma brisa gelada que balançavam os cabelos que não estavam presos no elástico cor-de-rosa, que foi o único que achou enquanto se arrumava.
O céu estava nublado, mas às vezes as nuvens se moviam e era possível ver uma ou duas estrelas.
Não tinha lua.
Não tinha emoção.
A noite tinha um gosto que combinava perfeitamente com ela: amarga.

domingo, 26 de setembro de 2010

Sobre um poeminha aleatório

Só para compensa a falta de criatividade que anda assombrando meus dias, vou postar um poeminha legal que esses dias tocou na Radio Caos.

O lado escuro da rua


Santinha era a menor morava longe
Atravessou de carona o país
Pinçou suas sobrancelhas de monge
Depilou suas pernas como uma velha infeliz
Ela disse: ei anjo, venha para o lado escuro da rua

Santa Cândida veio ao anel central de Curitiba
A rodoferroviária
Ela já era a preferida
Mas nunca perdeu sua estribeira
Mesmo quando lhe ofereceram uma carreira
Ela disse: querida, venha para o lado escuro da rua
E as mulheres negras dizem :de de de de de de


Quixote nunca saiu de cena
Todos tinham que pagar, pagar
Um empurrão aqui, outro na esquina
A capital do estado é o lugar onde dizem
Ei querida, venha para o lado escuro da rua


A doce fada pâmela caiu na vida
Em busca de pousada e um punhado de comida
Levantou, sacudiu a poeira
Dançou no metro
Agora todos tem prazer em conhece-la
Gogogo
Eles dizem: ei doce de coco venha para o lado escuro da rua


Jaqueline entrou em transe alucinado
Embarcou no voo de Leila Diniz por um dia
Acho que o desastre não podia ser evitado
Mas quem sabe um bom calmante ajudaria
Ela dizia: ei querida, venha para o lado escuro da rua


E as mulheres negras dizem
dedededededededede

Sobre a paciência

Quem me conhece sabe que eu sou de Lua.

Tem dias que estou super feliz e outros em que dou patada em todo mundo. Isso reflete na minha paciência. Se eu marcar algo com você, e esse dia coincidir com meus bad day's, não se atrase. Você corre o risco de levar uma patada quando chegar, ou não encontrar ninguém, porque eu odeio esperar.

Enfim, pra quem leu "O Pequeno Príncipe" sabe que como o planeta dele é pequeno, uma vez ele viu o sol se pôr 43 vezes.

"Mas é preciso esperar"

Eu sempre ouvi dizerem que a única solução para os piores problemas é o tempo. Mas eu nunca tive paciência pra esperar o tempo resolver minhas intrigas, meus problemas sentimentais. Fiquei tentando achar uma solução, e uma hora percebi que nada mais adiantava. E então vi que talvez seja verdade.

Talvez o tempo seja o melhor remédio, mas esse tempo só funciona se você souber esperá-lo e vivê-lo. Não adianta parar, sentar e esperar. Tenha consciência que a vida passa enquanto você espera. Esqueça que você está esperando.

Como disse Clarice:

"Foram então aprender que, não se estando distraído o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue[...]"
Tenham paciência. Esperem.


"É o tempo que dedicaste a tua rosa que a torna tão importante" (Antoine de Saint- Exupéry)

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Sobre os dois lados

Não é falsidade.

Conheço muitas pessoas que agem artificialmente, que criaram uma "máscara" para proteger seus defeitos (ou até mesmo qualidades) por acharem que eles demonstram vulnerabilidade, fraqueza, tudo o mais.

Talvez não seja por mal. Muita gente se aproveita desses “defeitos”, usando essas pessoas, atingindo pontos fracos, tirando proveito da bondade das pessoas.

Alguns agem como pessoas rudes de dia, e quando estão sozinhas, colocam suas pantufas, pegam uma panela de brigadeiro e comem em frente da televisão. Tudo secretamente.

Por que não expor suas atitudes? Por que não mostrar que você é uma pessoa sensível, que chora com filmes bobos de romance, que adora andar de meia, que ganha seu dia quando vê uma borboleta no seu jardim, que adoraria ter alguém que lhe desse flores?

Por que se esconder?

domingo, 19 de setembro de 2010

Sobre os sentimentos

Para ser mais específica, sobre o amor. Eu até ia escrever sobre minha trajetória romântica, mas isso é muito pessoal. Talvez um dia eu conte pra vocês.
Achei uns poemas legais sobre isso. Leiam :)

Ah, resolvi colocar o ano que nasceu e morreu cada poeta, pra vocês terem uma ideia de quando foi escrito.

"Um dia descobrimos que beijar uma pessoa para esquecer outra, é bobagem.

Você não só não esquece a outra pessoa como pensa muito mais nela.
Um dia nós percebemos que as mulheres têm instinto "caçador" e fazem qualquer homem sofrer.

Um dia descobrimos que se apaixonar é inevitável.

Um dia percebemos que as melhores provas de amor são as mais simples.

Um dia percebemos que o comum não nos atrai.

Um dia saberemos que ser classificado como "bonzinho" não é bom.

Um dia perceberemos que a pessoa que nunca te liga é a que mais pensa em você.

Um dia saberemos a importância da frase: "Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas..."

Um dia percebemos que somos muito importantes para alguém, mas não damos valor a isso.

Um dia percebemos como aquele amigo faz falta, mas ai já é tarde demais.

Enfim...

Um dia descobrimos que apesar de viver quase um século esse tempo todo não é suficiente para realizarmos todos os nossos sonhos, para beijarmos todas as bocas que nos atraem, para dizer o que tem de ser dito.

O jeito é: ou nos conformamos com a falta de algumas coisas na nossa vida ou lutamos para realizar todas as nossas loucuras.

Quem não compreende um olhar tampouco compreenderá uma longa explicação."

Mario Quintana (1906-1994)


"Inscrição na Areia

O meu amor não tem importância nenhuma.

Não tem o peso nem de uma rosa de espuma!

Desfolha-se por quem?

Para quem se perfuma?

O meu amor não tem importância nenhuma."


Cecília Meireles (1902- 1964)




"E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.

Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.

Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela."


Fernando Pessoa (1888-1935)


quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Sobre a importância dos amigos

Até os 4 anos eu não tinha amigos, exceto por uma vizinha da frente que se mudou 1 ano depois de eu desobrir a existência dela e ter ido algumas vezes à casa dela pra brincar (e comer, bons tempos). Então, eu entrei no Jardim I (que emoção again) e descobri que quando você se relaciona com pessoas parecidas (ou nesse caso, da mesma idade), a vida pode ser menos monótona. Fiz amiguinhos de caixa de areia. Era legal.

Com 6 anos, então, eu entrei no pré. Era outra escola, bem mais perto da minha casa. Eu fiquei com medo, mas não fui embora chorando. Fiz amiguinhos e até uma inimiga, que arrumava intrigas pra me prejudicar (ò.ó). Eram os amigos do pré, e a maioria saiu da escola, porque eu nunca mais os vi.

Passando para a primeira série, era uma emoção maior ainda, porque era uma sala normal (a sala do pré era isolada e tinha mesinhas pequenas e até um banheiro) e tinha muitas pessoas diferentes. Fiz mais amigos ainda, eu era até bem popular entre os coleguinhas da sala.

E assim foi até a quarta série. Eu comecei a participar do grupinho do fervo e talz, era bem maloqueira. Considero uma das melhores épocas escolares, eu tinha muitos amigos e acreditava neles.
Minha melhor amiga era a Fer, que me persegue até hoje na UTF.

Na quinta série a Fer se mudou e foi pra outro colégio, e eu passei a estudar de manhã, o que era considerado uma evolução incrível na minha escola. As pessoas da tarde eram rejeitadas, não me pergunte porquê.

Eu tinha alguns amigos, entre eles a Bruna. Uma vez a Gabi jogou terra na cara dela e ficou uma semana pedindo desculpas, e viramos amigas, apesar de nós nos conhecermos desde a primeira série. Ela não falava comigo porque me achava metida, e vice-versa. Então formou-se um grupinho, que se manteve até a sexta série. Então, por alguma razão que eu não lembro qual, o grupo se separou e formaram-se outros maiores.

E assim foi, até a oitava série, onde eu conhecia quase todo mundo da escola. Eu era popular, mas não me aproveitava disso. Meu grupo de amigos era grande, tinha desde pessoas que eu conheci no pré, até a My, por exemplo, qu eu conheci na sétima série.

Essa, talvez seja a melhor fase da minha vida. Depois da formatura eu percebi que nunca mais veria todas aquelas pessoas reunidas, e senti uma saudade estranha, porque sabia que não voltaria mais.

Entrando na UTF, o mundo se abriu de um jeito muito estranho. Saí de uma escola, na qual eu estudei 8 anos, onde eu sabia onde todo mundo morava, para uma Universidade situada no Centro, onde os professores não sabem meu nome, onde eu não sei onde meus colegas moram, onde eu não conheço nem metade das pessoas que lá estudam.

Isso foi uma grande mudança, foi muito difícil de me adaptar, mas creio que essa possa ser considerada (também) uma das melhores fases, não escolar, mas talvez da minha vida.

Essas mudanças me fizeram perceber que, mesmo com as brigas e intrigas que existem nos grupos de amigos, talvez eles sejam as pessoas mais importantes das nossas vidas. Eles nos apoiam, nos encorajam, nos fazem pensar duas vezes antes de fazer alguma coisa, enfim. Amigos são essenciais.

OBS: esse post é dedicado a todos os amigos, de todas as épocas, de todos os grupos, de todas as brigas, de todas as escolas, de todos os bairros, de todos os nomes, de todo o tempo que ficaram comigo. Obrigada.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Sobre o possível destino

Eu nunca acreditei muito nessas coisas místicas tipo espíritos, destinos e tal. Sempre achei que fosse uma forma de amortecer os efeitos das coisas ruins que acontecem conosco, tipo, vai melhorar, um dia passa, etc.

Mas talvez tudo tenha um porquê.

Por exemplo, quando eu terminei o jardim II (que emoção), as professoras queriam me matricular direto na primeira série, diziam que era inútil eu fazer o pré. Mas minha mãe achou que seria difícil pra mim, porque eu tinha capacidade intelectual, mas de todo jeito ainda era uma menininha de 5 anos.

Se eu tivesse pulado o pré, talvez minha vida fosse totalmente diferente. Meus amigos seriam outros, talvez até as modas que eu seguia quando tinha 12 anos fossem diferentes. Talvez eu não estivesse na UTF. Talvez meus amigos fossem aquelas pessoas que hoje eu encontro na rua indo para o trabalho, ou até mesmo com filhos. Talvez meus conceitos de felicidade, amizade, família, tudo seria visto de uma maneira totalmente diferente.

Talvez meus amores platônicos fossem outros. Ou talvez eu não os teria.

Eu ouviria músicas diferentes, usaria outras roupas, falaria outras gírias... tudo seria diferente. Tudo porque eu seria uma criança de 6 anos numa classe cheia de crianças de 7 anos.

Eu gosto da minha vida. Às vezes penso nos inúmeros caminhos que tive a seguir e a vida que teria se os tivesse seguido. As proibições que meus pais me faziam, desde simples visitas às amigas até as festas mais badaladas do colégio. Uma festa a mais, uma visita a mais. Só isso poderia mudar a minha vida?

Tenho pensado que sim, mas chega em um ponto que eu não consigo me imaginar com outra vida. Seria muito estranho. Talvez não fosse eu.

domingo, 12 de setembro de 2010

Sobre uma história que me faz pensar

Já faz um tempo que um padre contou essa história numa missa, e até hoje lembro dela quando as infinitas definições sobre Deus invadem meus pensamentos e me deixam completamente confusa.
A história é mais ou menos assim:

“Certa vez haviam três homens jogando golfe. Um deles perguntou aos outros dois:
- O que você faria se o mundo acabasse hoje?
O primeiro respondeu:
- Iria correndo procurar um padre para me confessar.
O segundo respondeu:
- Iria procurar minha família, pois faz anos que não os vejo.
Ambos perguntaram ao terceiro, que tinha feito a pergunta, o que ele faria?
E ele os disse:
- Continuaria jogando golfe.”

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Sobre a mania da perfeição

Uma vez eu vi na capa de um livro (que sempre tento lembrar o nome,mas todas as tentativas são em vão), uma frase que dizia: "Em um mundo de extrema perfeição o normal é feio".

Fiquei algum tempo com essa frase ecoando na minha cabeça, tentando descobrir o que ela realmente quer dizer. Consultei minha visão sobre o mundo. Era tão fraca, tão fútil. Me senti mal. Comecei a pensar nessa obcessão que todos têm. A busca pela perfeição. Não importa onde. Todos são maníacos por ela. Pessoas fazem loucuras, isso lhes custa até mesmo a vida.

Eu acho isso tão venenoso. Apesar de TODOS saberem que não existe a perfeição, ainda a buscam. Por quê??

Por que é tão difícil aceitar seu cabelo, seus olhos, seu nariz, sua boca, suas manias, suas estranhezas, suas preferências, seu mundo?

Dá pra mudar? Algumas coisas sim.
Pra quê? Ainda não sei.

Aceitar-se é difícil? Talvez seja uma das coisas mais difíceis de se fazer. Mas mudar não vai fazer com que você se aceite melhor. Você vai saber que não é assim. No fundo você lembra de quem realmente é.

E quando se deitar vai ficar pensando se o dia teria sido igual se você fosse quem realmente é. Se fizesse as coisas pensando somente em você, na sua felicidade, antes de pensar nos outros, na aceitação de pessoas que às vezes nem gostam de você.

O perfeito não existe. Não busque a perfeição. Quanto mais você a busca, mais se afasta dela.

Perfeitas são as pessoas que são felizes do jeito que são, que conquistam amigos e amores com seu jeito autêntico.

“Sejam vocês mesmas! Estudem cuidadosamente o que há de positivo ou negativo na sua pessoa e tirem partido disso. A mulher inteligente tira partido até dos pontos negativos. Uma boca demasiadamente rasgada, uns olhos pequenos, um nariz não muito correto podem servir para marcar o seu tipo e torná-lo mais atraente. Desde que seja seu mesmo.”
(Clarice Lispector sob o pseudônimo de Helen Palmer)

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Sobre meus pensamentos

Pra quem me conhece, sabe que eu tenho medo de muitas coisas. Não necessariamente de algo ou alguém, mas geralmente de fatos.

E se isso acontecer? E se não for assim? E se eu morrer?

Em geral essas dúvidas ocorrem em momentos de fraqueza, ou depois de horas filosofando, geralmente quando eu estou sozinha, ou antes de dormir, ou fuçando históricos de MSN e vendo as brigas que aconteceram.

Talvez esse seja um dos defeitos que mais odeio em mim. Minha insegurança.

Às vezes eu nem estou em um dia ruim, mas aí vejo algo que me lembra algum fato ruim, e começo a pensar sobre aquilo, se vai se repetir, se deveria esquecer, se deveria tirar a história a limpo (pela enésima vez).

Então penso: "Pare com isso Alessandra, você é uma idiota por voltar nesse assunto de novo."

Aí coloco uma música animada, e logo (finjo) que esqueço dos meus pensamentos.

No meio da noite, acordo assustada. Olho no relógio. Geralmente são 4, 5 da manhã. E volto aos meus pensamentos. E volto a brigar comigo mesma. E volto a me distrair.

É uma sucessão de fatos que me cansa. Acordo e nem parece que dormi tanto tempo.

Às vezes odeio meus pensamentos.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Sobre o positivismo (com medida)

Devido ao excesso de realismo que vem dominando meu blog, eu vim trazer algumas energias boas. Talvez ser realista demais seja ruim de vez em quando. Mas eu não gosto de muito otimismo, porque se você acredita que tudo vai dar certo e não dá, você se decepciona mais do que se não tivesse esperando tanto por algo, ou até mesmo por alguém.

Victor Hugo descreve isso num de seus poemas mais famosos. Vocês devem conhecer, porque Frejat fez uma música com algumas partes desse poema (Amor pra recomeçar).

É um poema fácil de ler, espero que consigam se motivar.

"Desejo primeiro que você ame,
E que amando, também seja amado.
E que se não for, seja breve em esquecer.
E que esquecendo, não guarde mágoa.

Desejo, pois, que não seja assim,
Mas se for, saiba ser sem desesperar.

Desejo também que tenha amigos,
Que mesmo maus e inconseqüentes,
Sejam corajosos e fiéis,
E que pelo menos num deles
Você possa confiar sem duvidar.

E porque a vida é assim,
Desejo ainda que você tenha inimigos.
Nem muitos, nem poucos,
Mas na medida exata para que, algumas vezes,
Você se interpele a respeito
De suas próprias certezas.

E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo,
Para que você não se sinta demasiado seguro.
Desejo depois que você seja útil,
Mas não insubstituível.
E que nos maus momentos,
Quando não restar mais nada,
Essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.

Desejo ainda que você seja tolerante,
Não com os que erram pouco, porque isso é fácil,
Mas com os que erram muito e irremediavelmente,
E que fazendo bom uso dessa tolerância,
Você sirva de exemplo aos outros.

Desejo que você, sendo jovem,
Não amadureça depressa demais,
E que sendo maduro, não insista em rejuvenescer
E que sendo velho, não se dedique ao desespero.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e
É preciso deixar que eles escorram por entre nós.

Desejo por sinal que você seja triste,
Não o ano todo, mas apenas um dia.
Mas que nesse dia descubra
Que o riso diário é bom,
O riso habitual é insosso e o riso constante é insano.

Desejo que você descubra ,
Com o máximo de urgência,
Acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos,
Injustiçados e infelizes, e que estão à sua volta.

Desejo ainda que você afague um gato,
Alimente um cuco e ouça o joão-de-barro
Erguer triunfante o seu canto matinal
Porque, assim, você se sentirá bem por nada.

Desejo também que você plante uma semente,
Por mais minúscula que seja,
E acompanhe o seu crescimento,
Para que você saiba de quantas
Muitas vidas é feita uma árvore.
Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro,
Porque é preciso ser prático.
E que pelo menos uma vez por ano
Coloque um pouco dele
Na sua frente e diga 'Isso é meu',
Só para que fique bem claro quem é o dono de quem.

Desejo também que nenhum de seus afetos morra,
Por ele e por você,
Mas que se morrer, você possa chorar
Sem se lamentar e sofrer sem se culpar.

Desejo por fim que você sendo homem,
Tenha uma boa mulher,
E que sendo mulher,
Tenha um bom homem
Eque se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes,
E quando estiverem exaustos e sorridentes,
Ainda haja amor para recomeçar.

E se tudo isso acontecer,
Não tenho mais nada a te desejar. "

Victor Hugo

sábado, 4 de setembro de 2010

Sobre a visão (de alguém) sobre o mundo

Ele tinha uma namorada. Ele a amava, talvez mais do que tudo. Ela sempre demonstrava sentir o mesmo, mas certo dia ela lhe disse que o traiu. Em pensamento. Ela pediu mil desculpas, falou que foi a primeira e única vez. Ele nunca mais a olhou do mesmo jeito.

Depois de algum tempo, cansado de mentiras (tanto dele, que demonstrava confiar nela, quanto dela que demonstrava ama-lo), eles terminaram.

Nos primeiros dias ele ficou muito bem. Tornou-se uma pessoa que nunca tinha sido. Mas depois de algumas semanas começou a sentir falta dela. Mas não voltaria, de jeito nenhum, seria um absurdo.

Então, certo dia ele a encontrou por acaso. Ela o viu, mas fingiu que não vira. Ele ficou olhando nos olhos dela. Ela passou reto, como se ele fosse um desconhecido.

Se deu conta então do momento que estava vivendo. Andou por muitas horas, esqueceu-se de tudo o que tinha a fazer. Perdeu o rumo. Passou por lugares desconhecidos. Olhava apenas para o chão. Raramente olhava para os lados, exceto quando ia atravessar a rua. Pensou. Pensou. Pensou. E pensou mais um pouquinho.

Estava anoitecendo e ficou frio. E ele continuou andando. Talvez o frio tenha o ajudado a perceber e interpretar os inúmeros pensamentos que estavam se fundindo em sua cabeça. Eram os amigos que desapareceram sem sequer avisar, os sermões de seu pai que chegavam sem motivo, as mulheres que ele sempre amou e que nunca olharam para sua cara, a mulher que sempre olhou para sua cara e que ele não amava mais. Ou amava.

Tudo isso misturado, formando um sentimento inédito, uma sensação de tristeza nunca antes sentida. Uma visão sendo formada. Complexa e ampla como nunca imaginou que poderia ter.

Eram as desmotivações, os acertos, as empolgações, o abismo que separava o antes e o depois, os erros, as desilusões, os momentos de extrema alegria, os de extrema tristeza, todos os fatos de uma vida reunidos em um único sentimento. Um único pensmento. Uma única pessoa.

Ele não suportaria. Viu uma ponte e se jogou.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Sobre as chances perdidas

Ela sempre acordava na mesma hora. Fazia sempre o mesmo caminho. Via sempre as mesmas pessoas.Ela conhecia as roupas que elas tinham, sabia até mesmo o nome. Sempre. Na mesma hora.

Ele apareceu naquele dia e começou a fazer parte de sua rotina. Tinha olhos azuis, quase sempre usava bermuda, a única exceção eram os dias realmente frios. Sempre de mochila. Às vezes tirava dela um livro e tentava ler. Nunca conseguia se concentrar. Talvez fosse o chacoalhar do ônibus ou as conversas. O ônibus era cheio àquela hora.

Ele descia um ponto antes dela. Certo dia, no congestionamento ela conseguiu observar seu caminho. Ele sempre entrava em uma casa. Ela queria muito saber o que tinha lá dentro. Mas nunca teve coragem de segui-lo.

Ela sempre o observava, desde então. Ele talvez nunca tenha sentido sua presença, mas ela sempre estava lá.

Naquele dia ela tomou coragem e sentou ao lado dele. Tinha passado horas pensando se devia fazer isso. Então tentou ser natural, mas não conteve a vontade de passar mais maquiagem do que de costume, usar outro perfume e uma roupa mais arrumadinha.

Almoçou mais cedo, não queria perder o abençoado ônibus. Quando chegou na fila, ele não estava lá. Ela pensou: não faz mal, eu vim antes mesmo. E o ônibus chegou. ela olhou discretamente para trás. Ele chegou. Acompanhado.

Talvez ela devesse ser mais corajosa.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Sobre um mundo ideal

Eu sempre quis ter o poder de criar mundos paralelos. Talvez naqueles dias ruins, em que nada dá certo, eu poderia fugir para lá, e esquecer de tudo.

Seria uma nova Ale. Um outro mundo. Outras pessoas, outros amigos, outros lugares. Seriam novas rotinas, novas obrigações (porque talvez um mundo sem obrigações não fosse tão ideal assim), enfim, um refúgio.

Eu sei que isso nunca vai existir. Mas sei lá, não custa imaginar.

As pessoas não necessariamente seriam outras. Ou seriam. Ah, seria um lugar perfeito. Não teriam desastres, nem piadas ruins. Ninguém brigaria. Ninguém reclamaria do que tem. As pessoas só iriam pra lá quando realmente estivessem exaustas de tantas reclamações, insatisfações com tudo que elas fazem. Lá todos achariam que ela está certa. Todos elogiariam o que ela faz. Ninguém colocaria defeitos, as críticas seriam construtivas e faladas calmamente, civilizadamente.

Não existiria o bonito. Não existiria o feio. Existiria o ideal de cada um. Cada um teria sua beleza e ninguém correria atrás de um ideal, um padrão.

Mas se fosse assim, talvez não seriam humanos.